O Presidente angolano excluiu duas empresas, uma das quais associada a Isabel dos Santos, do consórcio encarregue da construção, por mais de 4.500 milhões de dólares, da barragem de Caculo Cabaça, que será a maior do país. João Lourenço continua a abrir fogo contra um dos seus alvos privilegiados. Como se dizia no tempo, muito recente, em que JLo era fiel a acólito de Eduardo dos Santos, só atiram pedras às árvores que dão fruto.
Em causa está o despacho presidencial 79/18, de 12 de Julho, assinado por João Lourenço, que aponta a “necessidade da modificação subjectiva” do consórcio responsável pela obra, com a “saída das empresas CGGC & Niara Holding Limitada e da Boreal Investment Ltd”, justificada com o “objecto do contrato e do seu equilíbrio financeiro”.
“Necessidade da modificação subjectiva”? Hum! Seria aconselhável, segundo a normalidade de um Estado de Direito, explicar ao comum dos mortais o que é isso. No entanto, quem será capaz de o fazer?
Com esta decisão, fica como “parte única” no contrato com o Estado angolano (objectivamente o MPLA), e “respectivas prestações e responsabilidades”, a empresa China Ghezouba Group Company (CGGC).
Uma notícia publicada em 2017 pelo Makaangola, do jornalista Rafael Marques, referia que a CGGC & NIARA Holding Limitida era uma empresa de direito angolano, fundada a 23 de Maio de 2013, e cujos sócios são a sociedade 2I’S – Sociedade de Investimentos Industriais SA, “com sede no endereço de uma das residências privadas de Isabel dos Santos”, filha do ex-Presidente da República e ainda Presidente do MPLA, José Eduardo dos Santos, e a CGGC -Engenharia de Angola Lda., representada por Zhou Cheng, cada um com 50 por cento do capital.
“O endereço usado para o registo da 2I’S é o mesmo usado por Isabel dos Santos, como seu endereço residencial em Luanda, no registo da Niara Holding SGPS, em 2013, na ilha da Madeira, em Portugal”, lê-se na notícia do portal Makaangola, que associa igualmente a Boreal Investment à empresa e filha do ex-Presidente angolano.
O Aproveitamento Hidroeléctrico de Caculo Cabaça, comuna do município da Banga, na província do Cuanza Norte, será, dentro de cinco anos, a maior barragem em Angola, gerando 2.172 MegaWatts (MW) de eletricidade.
Em Junho de 2015, a obra, avaliada em 4.532 milhões de dólares (3.874 milhões de euros), com financiamento do Banco Comercial e Industrial da China, foi entregue, sem concurso público, pelo então chefe de Estado angolano ao consórcio CGGC & NIARA Holding Limitada.
Um ano depois, o Presidente da República aprovou um outro despacho, acrescentando ao consórcio as empresas Ghezouba Group Company e Boreal Investment.
No despacho presidencial de 12 de Julho de 2018, o ministro da Energia e Águas é autorizado a “praticar todos os actos necessários à saída” do consórcio das duas empresas, bem como a “indicar as empresas a subcontratar dentro dos limites do contrato da empreitada”.
Recorde-se que José Eduardo dos Santos inaugurou no dia 4 de Agosto de 2017 a maior barragem do país, em Laúca, e lançou a primeira pedra em Caculo Cabaça, que a vai superar, obras no rio Kwanza avaliadas em 7.500 milhões de euros. Nesse dia (antes de ser apunhalado pelas costas) ouviu também os seus acólitos resumirem a sua divina presença no mundo e que se pode definir na máxima: Deus no céu, Dos Santos na terra.
De iniciativa do Estado angolano, as duas barragens estão instaladas ao longo de cerca de 20 quilómetros do rio Kwanza, entre as províncias de Malanje e do Cuanza Norte, e representam as maiores obras públicas na liderança de José Eduardo dos Santos (em 42 anos de independência ele somou 38).
Nas duas cerimónias, além da inevitável corte de ministros e similares, o chefe de Estado teve ao seu lado o vice-Presidente, Manuel Vicente.
“Nunca lhe seremos suficientemente gratos, camarada Presidente”, observou, na sua intervenção oficial, em Laúca, o ministro da Energia e Águas, João Baptista Borges, naquela que terá sido a última grande obra inaugurada por José Eduardo dos Santos, enquanto chefe de Estado, mas que certamente não será a última para que os seus submissos acólitos terão a divina possibilidade de beijar a mão de sua excelência o “escolhido de Deus”.
O Aproveitamento Hidroeléctrico de Caculo Cabaça (gémeos, da tradição local), comuna do município da Banga, na província do Cuanza Norte, será, dentro de cinco anos, a maior barragem em Angola, gerando 2.172 MegaWatts (MW) de electricidade.
A obra, a quarta barragem na bacia do médio Kwanza, cuja primeira pedra foi lançada por José Eduardo dos Santos, seria construída, conforme contratação feita em 2015 pelo Governo angolano, pelo consórcio chinês CGGC (China Gezhouba Group Corporation) & Niara Holding, por 4.532 mil milhões de dólares (3,8 mil milhões de euros), com financiamento do Banco Comercial e Industrial da China.
Com 103 metros de altura máxima, a barragem vai armazenar 440 milhões de metros cúbicos de água e integrará uma central e um circuito hidráulico previstos para um caudal de 1.100 metros cúbicos de água a debitar por segundo, entre quatro grupos geradores.
Segundo o ministro João Baptista Borges, tratava-se de um “grande projecto” nacional para Angola atingir a meta de 9.000 MW de capacidade instalada em todo o país até 2025.
Além do sistema de abastecimento da região norte, que inclui Luanda, entre outras províncias, Caculo Cabaça permitirá, através da interligação das redes centro e sul, a exportação de electricidade para países como a Namíbia ou África do Sul.
“Não nos podemos esquecer que estamos numa região em que o nosso país é um dos que de mais recursos energéticos primários dispõe, sobretudo a água”, sublinhou anteriormente João Baptista Borges.
Em plena barragem de Laúca, província de Malanje, o Ministério da Energia e Águas aproveitou a presença de José Eduardo dos Santos para descerrar um busto do chefe de Estado, como homenagem. A merecida homenagem (busto) só peca por não ser original e, por isso, fazer parte de inaugurações similares praticadas nas mais avançadas democracias do mundo, nas quais o MPLA se inspira: Coreia do Norte e Guiné Equatorial.
Trata-se de uma obra (não o busto, mas a barragem) que arrancou em 2012, a cargo da construtora brasileira Odebrecht, que ainda subcontratou várias empresas de origem portuguesa, casos da Somague Angola, Teixeira Duarte, Epos, Tecnasol e Ibergru, com mais de 250 trabalhadores, além de 130 empresas angolanas.
Considerada a maior obra de engenharia civil de sempre em Angola, e a segunda maior barragem em África, servirá para abastecer oito milhões de pessoas, chegando – dizia-se – em 2018 às províncias do centro do país, como o Huambo e Bié.
Foi encomendada por 4,3 mil milhões de dólares (3,6 mil milhões de euros), envolvendo financiamento da linha de crédito do Brasil e movimentou, nas várias fases, cerca de 13.000 trabalhadores.
Desde 11 de Março de 2017 – na altura também na presença do chefe de Estado -, que o enchimento em Laúca condicionou a operação nas restantes barragens do rio Kwanza, devido ao reduzido caudal, limitando o fornecimento de electricidade da rede pública a Luanda, por norma, a poucas horas por dia.
Com um volume de água de albufeira de mais de 2.500 milhões de metros cúbicos, o enchimento da barragem de Laúca só terminará em 2018, com a elevação até à quota 850, completando o reservatório na sua totalidade.
Nessa altura estarão em funcionamento as seis turbinas que estão instaladas, totalizando 2.070 MW de electricidade, mais do dobro da capacidade das duas barragens – Cambambe (960 MW) e Capanda (520 MW) – já em funcionamento no rio Kwanza.
Folha 8 com Lusa